Você é satisfeito com seu corpo? Sim?
Não? Chegamos a um ponto em que SER INSATISFEITO com o corpo se tornou quase uma
obrigação. Não basta ter saúde. É preciso ter o corpo da moça da capa da revista para agradar aos olhos de quem está constantemente observando e julgando. Estamos contaminados
pela ditadura da magreza e criando nossos filhos para se tornarem adultos
doentes.
Sim, é isso que tenho visto com
cada vez mais frequência. As pessoas estão mais e mais insatisfeitas e infelizes. Todos tem
uma meta e na maioria das vezes essa meta inclui emagrecer muitos quilos (e
cada vez mais), em pouco tempo e a qualquer custo, com ou sem saúde, com ou sem
ajuda profissional, com ou sem saúde mental e de preferencia sem glúten e sem
lactose. O que importa é emagrecer. Mais importante ainda é sair disseminando
essa ideia por ai. A ideia de que só é possível ser feliz magro. Só é possível conquistar
um amor, um emprego, uma promoção e até o direito a ir à praia, se você for
igualzinha à moça da capa da revista. Aquela moça photoshopada que nem se
reconhece na capa daquela revista. Até quem está saudável e satisfeito com seu
corpo é forçado a sentir a necessidade de mudar. Não porque acha que não está
bem, mas porque a sociedade exige, cobra, critica e não se dá por satisfeita
enquanto você não estiver cada vez mais insatisfeito. E se alguém comentar que
está feliz assim... vai escutar motivos suficientes para começar a dieta, mudar
a cor e o corte do cabelo, ficar com vergonha de ir à praia e ter vontade de trocar de roupa agora mesmo.
“Se a vizinha conseguiu, eu também
consigo”. “Se a atriz conseguiu emagrecer para fazer esse papel na TV à base de
alface e água eu também posso fazer” (Sim, elas poderiam ficar quietas, mas
fazem questão de divulgar este “super segredo” do "emagrecimento-anoréxico-perfeito").
E sempre tem alguém ali bem
pertinho de você para te dar “umas dicas ou toques”. “Não come glúten porque engorda”. Ou
torcem o nariz diante da sua sobremesa e soltam aquela frase agradável: “Acho que você ganhou peso no último mês”. Ou a clássica: "Nutricionista comendo isso?" - Não, nutricionista é E.T. Não sabia, não?
POR QUÊ????
Porque as pessoas precisam
observar, comentar, denegrir, comparar, competir, humilhar? Minha conclusão é que ninguém está
satisfeito com o que é, e chamar a atenção para o defeito do coleguinha ao lado
aparentemente tira o foco dos seus defeitos e desvia a atenção para o defeito
dos outros.
Agora, e quando existem crianças
envolvidas? Alguém já imaginou o que se passa na cabeça das crianças diante
dessa ditadura da magreza, diante do caráter medido pela aparência física?
Se nós, adultos, surtamos com essa cobrança excessiva, imaginem as crianças.
Muitas crescem observando as mães paranóicas
com a aparência física, comprando todas as revistas de dieta e seguindo uma
diferente a cada semana, obcecadas por plásticas, medicamentos, shakes, restrições,
atividades físicas excessivas... e nada preocupadas com o exemplo que darão aos
seus filhos. Muitas transferem suas metas para seus filhos e cobram que sejam
perfeitos, que sejam magros para serem bem aceitos, amados, conseguirem um bom emprego
ou um bom casamento. Aí a criança que não tem estrutura emocional para aguentar
tudo isso “desde sempre”, pira. E a mãe vai dizer que não sabe aonde errou.
Eu não sei o que o glúten e a lactose
fizeram para alguns médicos, mas parece que uma parte das minhas redes sociais procurou médicos que acreditam que eles são os vilões da dieta (e parece que se você
comer, não só vai ficar gorda, mas vai adquirir o vírus ebola instantaneamente).
A maioria, porém, nem se consultou com um “especialista”, mas se a vizinha postou que emagreceu assim, “eu também quero ter intolerância a lactose e a glúten”.
E pasmem!!!! Quase todo mundo emagreceu!!!! \o/ ???
Acompanhem comigo: o que sobra na
dieta de um ser humano sem glúten e sem lactose? Pois é... quase nada. Quase impossível
não emagrecer. A boa noticia é que se você fizer essa dieta por muito tempo, vai
continuar magro (ou não!) porque talvez nunca mais consiga comer esses
alimentos que cortou da sua dieta. O que acontece é que seu organismo “acostuma
a viver sem digerir essas substâncias” e quando você (tentar) voltar a consumir
esses alimentos pode ser que realmente tenha desenvolvido uma intolerância. Meta
alcançada com sucesso! (ou não).
Ah, está bem, você ainda achou
vantajoso? Pois saiba que existem muitas crianças (e adultos) no mundo inteiro
que dariam TUDO para não ter essas duas intolerâncias. Dariam TUDO para comer
um brigadeiro na festinha do amigo, dividir um lanchinho na escola, comer uma
fatia de bolo no aniversario do primo ou almoçar em qualquer restaurante sem se
preocupar. Mas não podem porque possuem limitações, problemas de saúde que
causam consequências. Limitações estas que VOCÊ ESTÁ DISPOSTO A TER PARA EMAGRECER! E consequências
essas, que você conhecerá em breve se ficar forçando seu organismo a viver no
limite: infecções, imunidade baixa, deficiências de vitaminas, e por aí vai...
A cada dieta nova nas capas de
revista, a cada descoberta milagrosa para emagrecer, concluo que as pessoas estão
perdendo o discernimento. Talvez seja falta de oxigenação no cérebro por conta
das dietas restritivas. E me preocupo muito com o que será de nossas crianças
daqui a poucos anos. Os transtornos alimentares começam assim. Dietas,
cobranças, frustrações, metas inalcançáveis, busca pela perfeição...e o ambiente
está cada vez mais propício. #medo
A verdade é que o segredo para ter o corpo perfeito não existe. O corpo perfeito não existe. Esse conceito é subjetivo, porque cada um enxerga a perfeição de uma forma diferente. Buscar a perfeição imposta por nossas mentes e pela sociedade gera frustrações porque cada organismo funciona de um jeito. Além disso, as nossas metas e os padrões da moda estão em constante mutação. Assim, essa busca se torna infinita e a insatisfação e a busca pelo inalcançável viram um vício.
Eu não vou desistir de ser uma nutricionista nadando contra a correnteza. Acredito que é possível ser saudável, aprender o que faz bem e o que faz mal sem restrições nem excessos, ter um bom relacionamento com a comida e SER FELIZ!
Vou ali comer um pãozinho com glúten e cobertura extra de lactose e volto mais tarde!